Friday, May 19, 2006

Blogues empresariais: moda ou realidade emergente?

Interessante este survey pela consultora Makowsky a 150 executivos das 1000 maiores empresas americanas, sobre blogues empresariais "corporate blogging". Foi feito em Fevereiro de 2006, e tem alguns números interessantes: apesar de 40% dos entrevistados nunca lerem blogues, 15% destas empresas mantêm-nos, sendo que 20% das mesmas fazem vigilância regular dos conteúdos de outros blogues empresariais.

Patriotismo Económico: conceito difícil para mentes lusas

1. Nos últimos dois dias houve um simpósio na Academia Militar, na Gomes Freire, sobre Intelligence Competitiva e Guerra da Informação. Uma uma assistência algo bocejante de militares e alguns quadros intermédios de grandes empresas foi espelho do estado de alerta da nossa economia a estas novas necessidades. Na verdade, o simpósio daria um certificado de prsença a quem se pré-inscrevesse previamente. É claro que muita gente foi para lá picar o ponto. E sentiu-se isso quando os supostos "debates" depois das intervenções não passaram de umas meras questões desenxabidas, sem irem aos pontos fulcrais de assuntos tão urgentes.

A um dado momento lá decidi intervir, com a maior sobriedade possível, sobre a realidade da "guerra cognitiva", e mais especificamente sobre o "e-rumor" e apossibilidade que hoje temos de deitar por terra a reputação de uma empresa portuguesa com uma estratégia de difamação electrónica bem montada, de que falei alguns posts acima, parecia que a assistência tinha acordado. Particularmente os quadros empresariais. Foi-me pedido que abreviasse a minha intervenção (que ia em pouco mais de 2 minutos), acedi, mas com o tempo, percebi que o meu tom, honesto, directo e apelando a um sentido de urgência, fora entendido pelos nossos altos guardiões da soberania do Estado como algo "agressiva", sobretudo para alguém quem nunca assumiu nenhum papel militar para além daquele que lhe pediram para além da inspecção.

2. Decepcionante foi, a meu ver, a intervenção do brilhante e ultra-premiado prof. Carvalho Rodrigues, que abusou da sua virtude em ter por hábito ver em toda a sua matemática investigação científica uma pista para grandes dissertações humanistas. Que até hoje lhe têm sempre valido inúmeros aplausos em todas as suas aparições públicas, desde este tipo de simpósios, até aos talk-shows do Herman José. Mais as inúmeras condecorações de Estado.

Com mérito. Inegável. O homem é intelectualmente prolífico e estimulante, um génio da Renascença, e sem dúvida uma pessoa interessante de se conhecer. Mas como consultor da NATO a dar um simpósio sobre o fenómno da guerra da informação, o dr. Carvalho deveria ter deixado as interpretações humanistas, e ter referido - caso soubesse - todos os conceitos fundamentais desta realidade que já ultrapassam desde há muito o estrito âmbito militar. Apenas nos últimos 3 minutos, referiu a realidade do adensamento das redes de comunicação entre núcleos e organizações terroristas internacionais a nível global, causado por uma falta de patrulhamento destas novas vias de comunicação da sociedade informacional.

Disrupção de redes - nem uma palavra; Perception Management - nem uma palavra; SPIN militar ou relações entre militares e jornalistas - nem uma palavra; Ataques informacionais - nada; aplicação disto a nível empresarial - .....

Não poderia o dr. Carvalho dar muita importância a isto, quando afirma que a informação que nos é dada pelos telejornais de hoje é totalmente irrelevante, no sentido em que apresentam realidades perante as quais as pessoas não podem fazer mais nada a não ser usar isso como tema de conversa do dia-a-dia. Como os mortos no Iraque (Ó membros gratuitos das associações de voluntariado, depois disto, é melhor voltarem para casa e repousarem-se, de preferência sem ligar a TV!). Depois, refere os blogues como um fenómeno "apenas para os amigos". Tb existe literatura e documentação online sobre o emergente papel dos blogues e sobretudo das redes de blogues, como contra-poder informativo e igualmente como fontes cada vez mais relevantes de Intelligence, estratégica económica. Para quem quiser ler... é assaz relevante.

3. Da intervenção do prof. Borges Graça, retive a expressão "patriotismo económico", que lá arrancou alguns acenos de cabeça nalguns participantes mais garbosos. Com efeito, após o 25 de Abril, a expressão "pátria" passou a ter conotação fascista. Apenas Manuel Alegre veio lançar uma pedra nesse charco discursivo político, durante estas últimas presidenciais. Onde é que já se tinha visto um político da esquerda a bradar a espada da pátria aos céus da mediatização?
Coisa rara. Já o mesmo não acontece noutros países como em França. Aquela que é apontada como a possível primeira Presidente da República feminina no hexágono, Ségolène Royale, mulher do actual presidente do PSF, François Hollande, concedeu ao jornal L'Echos a sua visão sobre o "patriotismo económico", que foi pela primeira vez utilizada com incisão pelo actual governo de direita:

"C'est le détournement d'un mot qui signifie aimer et servir son pays. Pour le gouvernement, qui ne s'alarme guère de la présence massive de fonds anglo-saxons au capital des entreprises françaises, c'est un gadget langagier qui couvre la privatisation de Gaz de France et tourne le dos à la constitution nécessaire de champions européens."

Bom sinal. Até certo ponto. Há que dizê-lo com uma certa frontalidade: nem tanto ao mar nem tanto à terra. Não vá uma certa esquerda passadista (ou direita emergente!) aproveitar esta ideia aqui em Portugal, para acenar com um iberismo bacoco e manter a vida da PT tal qual a temos conhecido até hoje, em nome da constituição de um "campeão europeu", que na verdade é um verdadeiro flop de gestão, e um atentado aos consumidores.

Um mal atávico de Portugal é que o patriotismo apenas é falado quando convém a alguém justificar a sua preguiça e uma reforma segura....


Friday, May 12, 2006

Recados vindos de França


É interessante como os franceses, que repetem constantemente que em matéria de inteligência económica estão "muito atrasados" em relação aos americanos, aos alemães e aos japoneses, parecem, pelo menos ao nível do discurso actual, ser aqueles que mais bradam sobre a importância da implantação de uma cultura de intelligence nas elites políticas e empresariais.
Alain Juillet, o Alto Responsável pela Inteligência Económica junto do governo francês, publicou ontem na revista La Nouvelle Usine, um texto com algumas passagens que importa reter aqui pelas nossas bandas. Passo a citar:

"Les normes ont un fort impact sur la compétitivité des Etats et des entreprises. C’est sur l’Union européenne que nous devons nous concentrer, parce qu’elle est la source essentielle de notre droit. Elle décide de normes qui concernent directement la vie des Européens, individus et collectivités et, par conséquent, des entreprises. Elle est le lieu où sont défendues nos positions auprès d’autres organisations qui édictent des normes (OMC). Les discussions au sein de l’Europe ne relèvent pas du même type de stratégie de négociation que la politique étrangère. En outre, nous devons passer d’une démarche de « puissance » à une démarche d’« influence », rendue nécessaire dans une Europe à 25. Il n’est plus possible désormais d’atteindre un résultat seul. Il faut adopter des stratégies d’alliance. Jusqu’ici, la France défendait trop souvent des positions plutôt que des intérêts. Nous devons acquérir cette culture de la négociation, qui n’est pas naturelle dans notre pays et faire du lobbying."

Será preciso dizer mais, Dr. Freitas do Amaral?

Thursday, May 11, 2006

A "Intelligence" na Construção Europeia


1. Há dias, foi comemorado por toda a Europa - Portugal inclusive - mais um 9 de Maio, o tão designado "Dia da Europa". Foi neste dia, para quem não sabe, que em 1950 o então Ministro dos Estrangeiros francês presenteou o Velho Continente com os seus abjectos dotes de oralidade, aquilo que ficaria escrito para a história como a "Declaração Schuman".
Tão escasso era o seu dom de oratória, que só algumas semanas mais tarde se viria a perceber que o conteúdo da sua declaração - integralmente escrita por Jean Monnet - era uma bomba, anunciando a intenção francesa de constituir uma Comunidade do Carvão e do Aço, pondo sob a direcção de uma Alta-Autoridade designada pelos estados, toda a produção destas duas matérias-primas. Foi o arranque em força do eixo franco-alemão, e da dinâmica da construção europeia.
O conteúdo do discurso de 9 de Maio era de facto belíssimo, e quase profético: "A Europa não se fará de um golpe, nem numa construção de conjunto: far-se-à por meio de realizações concretas que criem em primeiro lugar uma solidariedade de facto. A união das nações europeias exige que seja eliminada a secular oposição entre a França e a Alemanha."
Esta adaptação literária das teorias funcionalistas, com o seu conceito de spill-over, que ganhavam bastantes adeptos entre a tecnocracia europeia, como era o caso de Monnet, contrastava fortemente com um memorando secreto da diplomacia francesa, redigido uma semana antes e apenas revelado em 1978. Aí não eram os aspectos economico-técnicos nem morais que vinham ao de cima, mas antes as high-politics puras e duras da Guerra Fria, que se vivia então no sentido original da palavra: uma situação de movimentações militares exercidas de cada um dos lados da cortina de ferro, sem o mínimo contacto diplomático. Situação esta que só se aplacaria em 1955, quando as duas grandes potências, mais França e Reino Unido se sentam à mesa em Genebra. "Na verdade, nós já estamos em guerra", assim rezava o tal memorando que também sugeria que fosse criada uma CECA, afim de se poder proceder ao rearmamento alemão, para que por sua vez a Europa Ocidental pudesse conter uma eventual invasão soviética.
A construção europeia não foi filha de uma vontade de reconciliação, como pregam os euro-ingénuos. Foi filha do medo de um montro emergente a Leste, que desapareceu no limiar da década de 90

2. Robert Schuman, alsaciano de gema, era democrata-cristão, tal como o chanceler da RFA Konrad Adenauer, e membro supra-numerário do Opus Dei, organização que até hoje casa melhor um catolicismo fervoroso e tradicionalista com a tecnocracia mais descomplexada. Tal como ainda será hoje Otto de Habsbourg, o ainda hoje herdeiro da coroa do Império Austro-Húngaro, membro do parlamento europeu, e fundador do Movimento Europeu, que nos anos 50 foi financiado pela CIA para promover a construção europeia para fins anti-soviéticos. Habsbourg seria também um dos três elementos da cúpula do Círculo Pinay, clube internacional de contacto entre diferentes personalidades de topo dos meios militares e da intelligence europeia, tendo por base comum um ultra-conservadorismo e um anti-comunismo assaz assertivos. Às diversas reuniões desse clube que tiveram lugar ao longo de décadas, esteve por exemplo, o general António de Spínola. O objectivo era simples: a realização de acções de spin afim de evitar a proliferação de ideologias esquerdistas pela Europa Ocidental.
Na verdade, a intelligence e o lobbying, mais do que toda a verborreia tecnocrata que ainda grassa no discurso oficial sobre a Europa, esteve na base de um projecto de elites que foi a construção europeia. Foi em grande medida, para além dos sonhadores sinceros que também tiveram o seu papel inegável, o resultado de lóbis estruturados e discretos, não só como a CIA, mas também como o Opus Dei, ainda hoje uma super-potência da intelligence económica e estratégica com as suas mais de 100 000 pessoas colocadas em lugares-chave da economia, da política e da comunidade intelectual na Europa: quase 500 universidades, mais de 600 jornais e revistas, mais de 50 redes de rádio e televisão, etc..

Desde sempre, e cada vez mais nos dias de hoje da "sociedade em rede", vence na Europa quem souber estruturar as suas redes de informação e de influência. A história está aí para o comprovar.

Wednesday, May 10, 2006

Cultura de não-lobbying ou o cansaço de Freitas




















No seu "Bloguítica", Paulo Gorjão acusa o governo português de falta de diligência no sentido de pressionar a burocracia onusiana a fim de Portugal ganhar um lugar no recém-criado Conselho dos Direitos Humanos, que veio substituir a desacreditada Comissão homónima, que chegou ao ridículo de ser presidida pela Líbia de Kadhafi. Com efeito, Portugal perdeu por uma posição, com um currículo provavelmente mais convincente do que países como a Grécia ou a Holanda. Mas Portugal tratou da sua candidatura ao nível de um subsecretário de Estado, ao passo que outros países trataram as suas ao nível de um Ministro em Pessoa.

É motivo para dizer: o "cansaço" de Freitas do Amaral começa a sair-nos caro!

A juntar a isso parece pairar sobre nós a sombra de um atávico preconceito e medo da prática do lobbying internacional. Nunca mais me esquecerei quando nos últimos Encontros Internacionais de Sintra da SEDES, um jovem técnico superior do nosso Parlamento alertou para a falta de antenas parlamentares portuguesas junto da burocracia de Bruxelas. Ao contrário de outros muitos países mais expeditos, sem complexos de pequenez como a nossa. Falo por exemplo da Finlândia, que também conseguiu agora assegurar um lugar no Conselho dos Direitos Humanos.

Acontece que esse jovem, nessa reunião, recebeu uma repreensão até aí ainda não vista nos Encontros pelo presidente da mesa, antes de lhe cortar a palavra 30 segundos depois.