Friday, May 19, 2006

Blogues empresariais: moda ou realidade emergente?

Interessante este survey pela consultora Makowsky a 150 executivos das 1000 maiores empresas americanas, sobre blogues empresariais "corporate blogging". Foi feito em Fevereiro de 2006, e tem alguns números interessantes: apesar de 40% dos entrevistados nunca lerem blogues, 15% destas empresas mantêm-nos, sendo que 20% das mesmas fazem vigilância regular dos conteúdos de outros blogues empresariais.

Patriotismo Económico: conceito difícil para mentes lusas

1. Nos últimos dois dias houve um simpósio na Academia Militar, na Gomes Freire, sobre Intelligence Competitiva e Guerra da Informação. Uma uma assistência algo bocejante de militares e alguns quadros intermédios de grandes empresas foi espelho do estado de alerta da nossa economia a estas novas necessidades. Na verdade, o simpósio daria um certificado de prsença a quem se pré-inscrevesse previamente. É claro que muita gente foi para lá picar o ponto. E sentiu-se isso quando os supostos "debates" depois das intervenções não passaram de umas meras questões desenxabidas, sem irem aos pontos fulcrais de assuntos tão urgentes.

A um dado momento lá decidi intervir, com a maior sobriedade possível, sobre a realidade da "guerra cognitiva", e mais especificamente sobre o "e-rumor" e apossibilidade que hoje temos de deitar por terra a reputação de uma empresa portuguesa com uma estratégia de difamação electrónica bem montada, de que falei alguns posts acima, parecia que a assistência tinha acordado. Particularmente os quadros empresariais. Foi-me pedido que abreviasse a minha intervenção (que ia em pouco mais de 2 minutos), acedi, mas com o tempo, percebi que o meu tom, honesto, directo e apelando a um sentido de urgência, fora entendido pelos nossos altos guardiões da soberania do Estado como algo "agressiva", sobretudo para alguém quem nunca assumiu nenhum papel militar para além daquele que lhe pediram para além da inspecção.

2. Decepcionante foi, a meu ver, a intervenção do brilhante e ultra-premiado prof. Carvalho Rodrigues, que abusou da sua virtude em ter por hábito ver em toda a sua matemática investigação científica uma pista para grandes dissertações humanistas. Que até hoje lhe têm sempre valido inúmeros aplausos em todas as suas aparições públicas, desde este tipo de simpósios, até aos talk-shows do Herman José. Mais as inúmeras condecorações de Estado.

Com mérito. Inegável. O homem é intelectualmente prolífico e estimulante, um génio da Renascença, e sem dúvida uma pessoa interessante de se conhecer. Mas como consultor da NATO a dar um simpósio sobre o fenómno da guerra da informação, o dr. Carvalho deveria ter deixado as interpretações humanistas, e ter referido - caso soubesse - todos os conceitos fundamentais desta realidade que já ultrapassam desde há muito o estrito âmbito militar. Apenas nos últimos 3 minutos, referiu a realidade do adensamento das redes de comunicação entre núcleos e organizações terroristas internacionais a nível global, causado por uma falta de patrulhamento destas novas vias de comunicação da sociedade informacional.

Disrupção de redes - nem uma palavra; Perception Management - nem uma palavra; SPIN militar ou relações entre militares e jornalistas - nem uma palavra; Ataques informacionais - nada; aplicação disto a nível empresarial - .....

Não poderia o dr. Carvalho dar muita importância a isto, quando afirma que a informação que nos é dada pelos telejornais de hoje é totalmente irrelevante, no sentido em que apresentam realidades perante as quais as pessoas não podem fazer mais nada a não ser usar isso como tema de conversa do dia-a-dia. Como os mortos no Iraque (Ó membros gratuitos das associações de voluntariado, depois disto, é melhor voltarem para casa e repousarem-se, de preferência sem ligar a TV!). Depois, refere os blogues como um fenómeno "apenas para os amigos". Tb existe literatura e documentação online sobre o emergente papel dos blogues e sobretudo das redes de blogues, como contra-poder informativo e igualmente como fontes cada vez mais relevantes de Intelligence, estratégica económica. Para quem quiser ler... é assaz relevante.

3. Da intervenção do prof. Borges Graça, retive a expressão "patriotismo económico", que lá arrancou alguns acenos de cabeça nalguns participantes mais garbosos. Com efeito, após o 25 de Abril, a expressão "pátria" passou a ter conotação fascista. Apenas Manuel Alegre veio lançar uma pedra nesse charco discursivo político, durante estas últimas presidenciais. Onde é que já se tinha visto um político da esquerda a bradar a espada da pátria aos céus da mediatização?
Coisa rara. Já o mesmo não acontece noutros países como em França. Aquela que é apontada como a possível primeira Presidente da República feminina no hexágono, Ségolène Royale, mulher do actual presidente do PSF, François Hollande, concedeu ao jornal L'Echos a sua visão sobre o "patriotismo económico", que foi pela primeira vez utilizada com incisão pelo actual governo de direita:

"C'est le détournement d'un mot qui signifie aimer et servir son pays. Pour le gouvernement, qui ne s'alarme guère de la présence massive de fonds anglo-saxons au capital des entreprises françaises, c'est un gadget langagier qui couvre la privatisation de Gaz de France et tourne le dos à la constitution nécessaire de champions européens."

Bom sinal. Até certo ponto. Há que dizê-lo com uma certa frontalidade: nem tanto ao mar nem tanto à terra. Não vá uma certa esquerda passadista (ou direita emergente!) aproveitar esta ideia aqui em Portugal, para acenar com um iberismo bacoco e manter a vida da PT tal qual a temos conhecido até hoje, em nome da constituição de um "campeão europeu", que na verdade é um verdadeiro flop de gestão, e um atentado aos consumidores.

Um mal atávico de Portugal é que o patriotismo apenas é falado quando convém a alguém justificar a sua preguiça e uma reforma segura....


Friday, May 12, 2006

Recados vindos de França


É interessante como os franceses, que repetem constantemente que em matéria de inteligência económica estão "muito atrasados" em relação aos americanos, aos alemães e aos japoneses, parecem, pelo menos ao nível do discurso actual, ser aqueles que mais bradam sobre a importância da implantação de uma cultura de intelligence nas elites políticas e empresariais.
Alain Juillet, o Alto Responsável pela Inteligência Económica junto do governo francês, publicou ontem na revista La Nouvelle Usine, um texto com algumas passagens que importa reter aqui pelas nossas bandas. Passo a citar:

"Les normes ont un fort impact sur la compétitivité des Etats et des entreprises. C’est sur l’Union européenne que nous devons nous concentrer, parce qu’elle est la source essentielle de notre droit. Elle décide de normes qui concernent directement la vie des Européens, individus et collectivités et, par conséquent, des entreprises. Elle est le lieu où sont défendues nos positions auprès d’autres organisations qui édictent des normes (OMC). Les discussions au sein de l’Europe ne relèvent pas du même type de stratégie de négociation que la politique étrangère. En outre, nous devons passer d’une démarche de « puissance » à une démarche d’« influence », rendue nécessaire dans une Europe à 25. Il n’est plus possible désormais d’atteindre un résultat seul. Il faut adopter des stratégies d’alliance. Jusqu’ici, la France défendait trop souvent des positions plutôt que des intérêts. Nous devons acquérir cette culture de la négociation, qui n’est pas naturelle dans notre pays et faire du lobbying."

Será preciso dizer mais, Dr. Freitas do Amaral?

Thursday, May 11, 2006

A "Intelligence" na Construção Europeia


1. Há dias, foi comemorado por toda a Europa - Portugal inclusive - mais um 9 de Maio, o tão designado "Dia da Europa". Foi neste dia, para quem não sabe, que em 1950 o então Ministro dos Estrangeiros francês presenteou o Velho Continente com os seus abjectos dotes de oralidade, aquilo que ficaria escrito para a história como a "Declaração Schuman".
Tão escasso era o seu dom de oratória, que só algumas semanas mais tarde se viria a perceber que o conteúdo da sua declaração - integralmente escrita por Jean Monnet - era uma bomba, anunciando a intenção francesa de constituir uma Comunidade do Carvão e do Aço, pondo sob a direcção de uma Alta-Autoridade designada pelos estados, toda a produção destas duas matérias-primas. Foi o arranque em força do eixo franco-alemão, e da dinâmica da construção europeia.
O conteúdo do discurso de 9 de Maio era de facto belíssimo, e quase profético: "A Europa não se fará de um golpe, nem numa construção de conjunto: far-se-à por meio de realizações concretas que criem em primeiro lugar uma solidariedade de facto. A união das nações europeias exige que seja eliminada a secular oposição entre a França e a Alemanha."
Esta adaptação literária das teorias funcionalistas, com o seu conceito de spill-over, que ganhavam bastantes adeptos entre a tecnocracia europeia, como era o caso de Monnet, contrastava fortemente com um memorando secreto da diplomacia francesa, redigido uma semana antes e apenas revelado em 1978. Aí não eram os aspectos economico-técnicos nem morais que vinham ao de cima, mas antes as high-politics puras e duras da Guerra Fria, que se vivia então no sentido original da palavra: uma situação de movimentações militares exercidas de cada um dos lados da cortina de ferro, sem o mínimo contacto diplomático. Situação esta que só se aplacaria em 1955, quando as duas grandes potências, mais França e Reino Unido se sentam à mesa em Genebra. "Na verdade, nós já estamos em guerra", assim rezava o tal memorando que também sugeria que fosse criada uma CECA, afim de se poder proceder ao rearmamento alemão, para que por sua vez a Europa Ocidental pudesse conter uma eventual invasão soviética.
A construção europeia não foi filha de uma vontade de reconciliação, como pregam os euro-ingénuos. Foi filha do medo de um montro emergente a Leste, que desapareceu no limiar da década de 90

2. Robert Schuman, alsaciano de gema, era democrata-cristão, tal como o chanceler da RFA Konrad Adenauer, e membro supra-numerário do Opus Dei, organização que até hoje casa melhor um catolicismo fervoroso e tradicionalista com a tecnocracia mais descomplexada. Tal como ainda será hoje Otto de Habsbourg, o ainda hoje herdeiro da coroa do Império Austro-Húngaro, membro do parlamento europeu, e fundador do Movimento Europeu, que nos anos 50 foi financiado pela CIA para promover a construção europeia para fins anti-soviéticos. Habsbourg seria também um dos três elementos da cúpula do Círculo Pinay, clube internacional de contacto entre diferentes personalidades de topo dos meios militares e da intelligence europeia, tendo por base comum um ultra-conservadorismo e um anti-comunismo assaz assertivos. Às diversas reuniões desse clube que tiveram lugar ao longo de décadas, esteve por exemplo, o general António de Spínola. O objectivo era simples: a realização de acções de spin afim de evitar a proliferação de ideologias esquerdistas pela Europa Ocidental.
Na verdade, a intelligence e o lobbying, mais do que toda a verborreia tecnocrata que ainda grassa no discurso oficial sobre a Europa, esteve na base de um projecto de elites que foi a construção europeia. Foi em grande medida, para além dos sonhadores sinceros que também tiveram o seu papel inegável, o resultado de lóbis estruturados e discretos, não só como a CIA, mas também como o Opus Dei, ainda hoje uma super-potência da intelligence económica e estratégica com as suas mais de 100 000 pessoas colocadas em lugares-chave da economia, da política e da comunidade intelectual na Europa: quase 500 universidades, mais de 600 jornais e revistas, mais de 50 redes de rádio e televisão, etc..

Desde sempre, e cada vez mais nos dias de hoje da "sociedade em rede", vence na Europa quem souber estruturar as suas redes de informação e de influência. A história está aí para o comprovar.

Wednesday, May 10, 2006

Cultura de não-lobbying ou o cansaço de Freitas




















No seu "Bloguítica", Paulo Gorjão acusa o governo português de falta de diligência no sentido de pressionar a burocracia onusiana a fim de Portugal ganhar um lugar no recém-criado Conselho dos Direitos Humanos, que veio substituir a desacreditada Comissão homónima, que chegou ao ridículo de ser presidida pela Líbia de Kadhafi. Com efeito, Portugal perdeu por uma posição, com um currículo provavelmente mais convincente do que países como a Grécia ou a Holanda. Mas Portugal tratou da sua candidatura ao nível de um subsecretário de Estado, ao passo que outros países trataram as suas ao nível de um Ministro em Pessoa.

É motivo para dizer: o "cansaço" de Freitas do Amaral começa a sair-nos caro!

A juntar a isso parece pairar sobre nós a sombra de um atávico preconceito e medo da prática do lobbying internacional. Nunca mais me esquecerei quando nos últimos Encontros Internacionais de Sintra da SEDES, um jovem técnico superior do nosso Parlamento alertou para a falta de antenas parlamentares portuguesas junto da burocracia de Bruxelas. Ao contrário de outros muitos países mais expeditos, sem complexos de pequenez como a nossa. Falo por exemplo da Finlândia, que também conseguiu agora assegurar um lugar no Conselho dos Direitos Humanos.

Acontece que esse jovem, nessa reunião, recebeu uma repreensão até aí ainda não vista nos Encontros pelo presidente da mesa, antes de lhe cortar a palavra 30 segundos depois.

Monday, April 17, 2006

Duas OPA's, duas Filosofias

(In Notícias da Portela, hoje)

Há muito pouco tempo foi lançado um livro de dois jornalistas portugueses sobre a vida e a obra de Peter Drucker, o pai fundador da Gestão moderna. Curioso foi este livro ter surgido durante esta febre das OPA’s que nos tem assaltado desde o princípio do ano na Europa, inclusivamente em Portugal. isto porque aquele eminente guru, hoje com mais de 90 anos mas ainda em plena vida activa, sempre sustentou esta controversa ideia sobre fusões e aquisições entre empresas: “Não são solução. Fazem algum sentido se as entendermos como puramente defensivas em indústrias e sectores em declínio acelerado.” Nesta lógica, as empresas “opam” porque sentem que já não são capazes de continuar a crescer por si sós. Que já não conseguem obter novas mais-valias e defenderam-se da concorrência de outras formas. Para Drucker, as OPA’s são expedientes velhos, aos quais recorre quem carece de imaginação.

Penso que importa, não obstante, estabelecer algumas nuances. As recentes OPA’s portuguesas – da Sonae à PT e do BCP ao BPI – que tantas almas têm sacudido durante os últimos meses, não mais representam que uma gota num oceano de fusões e aquisições por essa Europa fora. Estas últimas são transfronteiriças, envolvem relações entre governos, e já ultrapassaram um volume de negócios superior a um trilião de euros. As nossas, cá entre Badajoz e o Cabo da Roca, assustam. E assustam porque anunciam uma mudança irreversível, a qual a mentalidade feudal e conservadora dos portugueses teima em recusar:. Essa mudança consiste numa cavalgada tão inexorável quanto descomplexada para uma verdadeira economia de mercado “à americana”. Uma economia onde o sobrevivente é aquele que tem as armas necessárias para fazer face a um clima altamente agressivo e hostil, onde já não será mais necessário “pedir licença” nem a governos nem a concorrentes para realizar verdadeiros ataques, sejam eles de natureza material (como alianças e fusões estratégicas, ou ofertas de aquisição hostis), ou de natureza informacional (ataques directos ou indirectos à imagem pública da concorrência).

Este caminho inevitável comportará uma série de inconvenientes. Por exemplo, custa a perceber que poderão ganhar os consumidores com a concentração da banca, mesmo se criando um ou dois “campeões nacionais” aptos a competir com os gigantes espanhóis como o Santander e o BBVA, que também cada vez mais assumem a sua veia predatória. Isto porque se a banca portuguesa tem funcionado em contra-ciclo com a economia nacional, isso não se deverá tanto a competências intangíveis, como ao aproveitamento da miserável situação do mercado imobiliário português, onde as rendas médias nas grandes zonas urbanas são superiores ao salário mínimo nacional, graças ao congelamento de muitas rendas que data desde os tempos de Salazar, que favorece a especulação. Assim, a banca nacional lucra a partir do endividamento excessivo e desregrado dos portugueses: tanto na compra de habitação como noutros consumos menos duráveis. Ao mesmo tempo, retrai-se em financiar projectos de jovens empresários. A expressão utilizada há cerca de um ano pelo então presidente Sampaio, para definir o comportamento geral da banca portuguesa foi concisa: “um embuste!”

Já a OPA da Sonae sobre a PT demonstra um espírito, arrisco dizê-lo, quase oposto. A maioria da actividade da Sonae SGPS não se refere às telecomunicações e a empresa do grupo que o faz – a Optimus de Paulo de Azevedo – representa a talvez mais vanguardista e captadora de tendências das empresas de telefonia móvel do mercado português. Um Belmiro em idade dita “de reforma” decide lançar uma operação sobre uma empresa quase cinco vezes mais valiosa que a Sonae, sem nenhum apoio de parceiros estrangeiros (como supostamente pretende Paes do Amaral, da Media Capital), unicamente contando com o apoio financeiro do Santander de Botín. Belmiro, que construiu o seu império já após o 25 de Abril, é visto como um outsider pela aristocracia empresarial portuguesa, um misto de “provinciano” de Marco de Canaveses com “estrangeirado” de Harvard. Assim, o provinciano-estrangeirado decidiu mostrar a sua face revolucionária e atacar-se a uma empresa que justifica há décadas com o seu estatuto de “empresa símbolo de Portugal” a exploração do consumidor português através do seu monopólio de facto e da sua concorrência desleal. E por isto é a PT mais a sua “golden share” do governo crescentemente acossada pelos tecno-burocratas de Bruxelas.

O lado positivo da emergência deste capitalismo deliberadamente agressivo encontra a sua expressão concreta na queda de executivos como Miguel Horta e Costa, recentemente afastado pelo Conselho de Administração da PT por alegar poder oferecer três milhões de euros aos accionistas até 2008, após declarar a OPA hostil. O conservadorismo do ex-presidente da PT, devidamente reflectido pelo sindicato da mesma empresa, é típico do género de executivo português que aprecia mais o poder do que o dinheiro. É corrente entre os meios empresariais portugueses a ideia de que o dito senhor nunca entendeu nada de gestão, mas que subiu na carreira à conta do seu estatuto social e do seu “saber estar”. O que sempre se contrapôs ao estilo “intelectual do Bronx” de Belmiro, progressivamente amainado por influência da personalidade mais discreta do seu futuro sucessor.

Com efeito, as realidades cruas do novo capitalismo agressivo já não são coniventes com este tipo de maquilhagens sociais que fazem as delícias de especialistas em etiqueta como Paula Bobone, e os lucros de publicitários de governos “do coração” como o se supôs o de António Guterres. Num futuro próximo, a ética e as boas maneiras deverão coexistir com um espírito empreendedor, assertivo e mais tolerante à ideia de instabilidade. Caso contrário, será um salve-se quem puder numa terra sem lei, uma verdadeira república das bananas, onde tudo vingará menos o mérito. Não tivesse sido o próprio Drucker a afirmar que em toda a história, a regra sempre foram os períodos de turbulência. Desengane-se que pensa que no futuro será normal ter uma posição garantida para a vida. Os períodos de acalmia sempre foram e cada vez mais serão a excepção.

Tuesday, April 11, 2006

"E-Rumor": nova arma das empresas portuguesas



Há dias recebi uma chain letter no meu Outlook intitulada “POWERLINE (PLC) - Mais uma desgraça para a humanidade”, assinada por um tal “Eng. Augusto Albuquerque” que, entre outras coisas acusava a tecnologia Powerline (PLC) de contribuir seriamente para o cancro, justificando devidamente com uma série de indícios técnicos tão alarmantes convicções. Aconselhava o mesmo mail que se passasse a mensagem e que se continuasse a dar preferência ao ADSL, a fim de matar no ovo tão tenebrosa conspiração orquestrada pela ONI e pela sua principal accionista, a EDP. Um dos últimos utilizadores de email da cadeia apenas acrescentara ao enviá-lo para a sua mailing list: será verdade?

Pouco depois, descobri este blogue: http://www.powerline.blogspot.com/, realizado pela equipa técnica da Powerline, rebatendo um por um os argumentos daquele mail, fazendo inclusivamente referência a resoluções oficiais das instituições comunitárias competentes desmentindo qualquer risco desta tecnologia de Internet emergente, que permite a provisão de telefone e Internet unicamente pela corrente eléctrica, e que está em fase experimental em algumas zonas do país, como Telheiras.

Entretanto, vim a saber que a Via Verde também fora vítima há um ou dois meses atrás deste mesmo expediente de boatos via Internet, acusando aquela empresa de práticas fraudulentas na gestão comercial com os seus clientes. Também o boato teve a impacto suficiente para que a Via Verde publicasse no seu site, a 24 de Fevereiro, um desmentido, e advertindo que “irá proceder judicialmente contra os autores deste boato anónimo e difamatório e contra quem promover a sua difusão.” (É motivo para perguntar se futuramente seremos vítimas de violação de correspondência electrónica, ou algo semelhante. Juristas da Comunicação, que me dizeis sobre o tal assunto?).

Em todo o caso, está visto que o rumor via Internet constitui uma arma crescentemente relevante no campo de batalha empresarial em Portugal. As empresas não lhes podem ser indiferentes, e essa impossibilidade de indiferença representa novos custos, e se estes continuarem a crescer podem significar uma nova área de negócio a despontar: a gestão do risco informacional, a protecção contra ataques de natureza informacional, dirigidos contra reputações. Numa sociedade em rede, o spin do mundo da política, assim como a contra-informação, do mundo militar e da intelligence, passam cada vez mais para o mundo das empresas, numa época em que o desenvolvimento das telecomunicações galopa freneticamente.

Isto porque o fenómeno dos rumores via Internet não são passíveis de gozar necessariamente de um crescimento exponencial, como demonstra nos seus trabalhos o eminente especialista na matéria, Pascal Froissard, que afirma convictamente ser o feómenos dos rumores uma construção social, historicamente desenvolvida, e não um dado natural da vida em sociedade. A demonstrá-lo, o autor chama a atenção para a evolução durante os anos 90 da relação entre o número de sites de rumores e o número total de sites na web. Enquanto o segundo tipo prossegue o seu crescimento exponencial, o primeiro demonstra sinais de estagnação. Para este efeito, alega Froissard, muito contribuiu o esforço, muitas vezes gratuito, de sites “anti-rumor”, como é o caso ilustrativo do hoaxbuster.com, entre muitos outros

Este novo fenómeno emergente está para o mundo empresarial como o fenómeno do terrorismo global esteve para a política internacional, na medida que que este alterou radicalmente o modo de fazer a guerra pelos Estados. Assim também esta nova “guerrilha da informação” vem trazer o mesmo tipo de problemas às empresas num ambiente de capitalismo cada vez mais hostil. Qual a proveniência dos ataques? Serão organizados, ou acidentais? Qual é o rosto destas novas ameaças, e como impedir a sua propagação quando cada vez mais pessoas acedem à Internet?

No caso da difamação da Powerline (como aliás, no da Via Verde), é impossível saber a origem. Mas é óbvio que se trata de um ataque contra a ameaça de uma tecnologia de Internet que actualmente favorece única e exclusivamente quem for participado pela eléctrica portuguesa – a EDP - que, por sua vez, ainda desfruta de um quase monopólio no mercado português, sobretudo junto aos grandes centros urbanos do litoral, que albergam mais de metade da população portuguesa. A empresa beneficiada com a introdução do Powerline no mercado das telecomunicações é obviamente a ONI, e os sócios da EDP (sobretudo o Millenium bcp). O maior perdedor é a PT, que espera assim que o Mibel se torne uma realidade o mais brevemente possível, antes que a nova tecnologia que garante entre 1MB e 2MB de upload passe da fase experimental para a venda em massa.

Monday, April 10, 2006

A guerra estala no sector das auto-estradas!

Numa altura em que a Brisa rejubila com um novo máximo histórico do valor das suas acções, esta pequena jóia da família Mello, que actua num dos poucos sectores em que Portugal exporta inovação (a concessão de auto-estradas), acaba de fazer história: é a primeira vez NA EUROPA que uma concessionária é impedida por uma Autoridade da Concorrência de proceder a uma aquisição de acções de uma concorrente, e que esta interpõe recurso ao Ministério da Economia contra tal decisão.

Esta situação tão inédita quanto bizarra só poderia acontecer num país com duas auto-estradas “repetidas” , com o mesmo circuito, como a A1 (da Brisa) e a A8 (das Auto-Estradas do Atlântico). Ora querendo a Brisa aumentar a sua participação de 10% para 50% na sua concorrente, certamente quererá ter o monopólio sobre as duas auto-estradas. Dando o seu parecer negativo, a instituição dirigida por Abel Mateus demonstrar querer fazer brotar um novo conceito de auto-estradas concorrentes. Portugal torna-se assim um inovador saudosista nesta matéria, invocando sem querer as linhas de ferro repetidas que foram sendo geradas em Inglaterra devido ao facto do sector ferroviário sempre ter sido privado.

É motivo para se afirmar com alguma segurança: já que se optou pela via tão inovadora quanto duvidosa das concessões de infra-estruturas rodoviárias (que potenciou um presidente português na associação europeia das concessionárias), que o princípio dos benefícios da “mão invisível” sejam levados até ao fim.

E que tal um novo Fim da História?


Quando esteve eminente a guerra no Iraque, os execrados realistas políticos eram quase tão execrados como os fervorosos neo-cons. O mais comum dos mortais, aliás, nem os distinguia: não tinham princípios, eram belicistas, ponto final. Acontece que os realistas políticos, sob a égide de pensadores cínicos como Kissinger (só para citar um clássico recente), foram dos primeiros a contestar a guerra contra Saddam, alegando que a história dos últimos 30 anos demonstrava que aquele odiado ser era passível de “contained”. Ninguém parace ter prestado atenção a isto: pior que os neo-cons e os apologistas dos falcões do pentágono, eram estes “homens sem princípios nem ideologia”, herdeiros de um pensamento “ultrapassado” datado da Europa do século XIX e do sistema bipolar da guerra fria.

Durante a década de 90, o excessivo dinamismo da globalização fez muitos pensar que as ideologias tinham conhecido o seu termo na história (Fukuyama). O 11 de Setembro veio pôr água na fervura dos saudosistas da ideologia, e as diferenças entre esquerda e direita ganharm um novo fulgor com as fissuras causadas pela guerra do Iraque, entre os “a favor” e os “contra”. Agora, que o preço do petróleo corre em direcção aos 80 dólares por barril, e as economias europeias e americana sofrem os consequentes efeitos, eis que verificamos um desejo premente das pessoas pela “não-ideologia”, e pela “economia pura”. Em Portugal, isso começou com a derrota do “filósofo” Manuel Maria Carrilho na corrida para a câmara de Lisboa contra o “técnico” Carmona Rodrigues, prosseguiu com a cavalgada reformista de pendor direitista do governo Sócrates e brilhou com a vitória histórica do tecnocrata Cavaco Silva.

Na América, por seu lado já se vão percebendo as diferenças entre os realistas políticos e os neo-cons. Redescobre-se uma das permissas fundamentais sempre olvidadas do realismo político em Relações Internacionais: a paz… pelo equilíbrio. Assim, o livro do general Tony Zinni, reformado oficial da Marinha com larga experiência de comando no Médio Oriente e no Sudeste asiático, livro este devidamente anunciado pelo Washington Post, vem também anunciar esta mesma tendência. Cite-se: "The real threats do not come from military forces or violent attacks; they do not come from a nation-state or hostile non-state entity. They do not derive from an ideology (not even from a radical, West-hating, violent brand of Islam). The real new threats come from Instability. Instability and the chaos it generates can spark large and dangerous changes anywhere in the land."

Se tudo corer bem para nós, que nos tornamos cada vez mais conservadores sem o sabermos, (“abaixo a instabilidade do CPE!”, grita a juventude francesa), os próximos 30 anos serão definitivamente os anos dos burocratas obedientes, dos juristas, dos economistas e dos tecnocratas anti-ideológicos. A guerra passará definitivamente a desenrolar-se no plano civil e com outras armas, sem balas, mas com muitos dólares e euros para ajudar à festa.